Há certos homens, ao longo da História, cuja grandeza ultrapassa qualquer lenda e esgota mesmo a mais rica capacidade de imaginação. Tais homens parecem ser objeto de uma especial predileção de Deus, o qual Se compraz em adornar cuidadosamente suas almas com o brilho das virtudes e de raríssimos dons. Predestinados desde o nascimento, sua vida se desenvolve em meio a aventuras extraordinárias e assombrosas que ora lhes favorecem o desempenho da missão, ora levantam-se como obstáculos intransponíveis, dando ocasião a lances de confiança e audácia que tornam suas pessoas ainda mais dignas de admiração.

No Antigo Testamento encontramos narrativas dessas a cada passo.

Extasiamo-nos diante do poder de um Moisés, que com o simples gesto de levantar seu cajado dividiu as águas do mar em duas gigantescas muralhas líquidas; ou perante a serena autoridade de Josué, que não duvidou em dar ordens ao próprio sol para deter o seu curso. Mais adiante, impressionam-nos a força de Sansão, ao carregar nos ombros as portas de Gaza, e o zelo ardoroso do profeta Elias, fazendo cessar a chuva durante três anos. A todos eles a Providência Divina concedeu o domínio sobre a natureza, essa fé que move montanhas e as faz saltar como cabritos…Tais prodígios sublinhavam o poder justiceiro do Criador e visavam, sobretudo, educar uma humanidade manchada pelo pecado original, sobre a qual ainda não se haviam derramado os benefícios da Redenção.

Imagem de São José feito no Peru

Uma nova economia da graça

Chegada a plenitude dos tempos, as manifestações da onipotência divina, longe de diminuir, atingiram um auge de profundidade e esplendor.

No Novo Testamento, porém, a grandeza se esconde muitas vezes sob os véus da comum existência humana, e isso é permitido por Deus para aumentar nossos méritos e acrisolar ainda mais nossa fé.

O exemplo paradigmático dessa nova economia da graça, nós o vemos realizar-se num varão cuja vida transcorreu na humildade e no silêncio, mas que mereceu ouvir dos lábios do Homem-Deus o doce nome de pai! Sem dúvida, Moisés, ao abrir o mar em duas partes, ou Josué, ao parar o sol, marcaram de forma indelével as futuras gerações. Mas, o que é ter sujeitado os elementos, criaturas inanimadas, diante da honra suprema de ser obedecido por Aquele de quem canta o salmista: “Mais forte que o bramido das ondas caudalosas, mais poderoso que o rebentar das vagas, é o Senhor lá nas alturas” (Sl 92, 4), e que mais tarde foi visto por Malaquias quando disse: “Para vós, que temeis o meu nome, nascerá o Sol da Justiça trazendo salvação em suas asas” (Ml 3, 20)? O que significa ter carregado às costas as portas de Gaza, em confronto com a glória de estreitar nos braços Aquele que afirmou de Si mesmo: “Eu sou a porta das ovelhas” (Jo 10, 7)? Caberá alguma comparação entre o profeta que fez parar a chuva e o patriarca cujas preces aceleraram a “chuva do Justo vindo das alturas” (cf. Is 45, 8)?

Uma das mais altas vocações da História

São José com o Menino Jesus –
Canadá

São José, o homem justo por excelência, o glorioso esposo de Maria e pai legal do Filho de Deus, é certamente um dos santos mais venerados pela piedade popular. No entanto, quase só ouvimos falar dele como “o artesão de Nazaré” ou “o padroeiro dos operários”. Esses títulos são muito legítimos, mas estão longe de nos dar idéia do píncaro de santidade  ao qual Deus houve por bem elevá- lo. Ele nunca será devidamente conhecido e venerado por nós se – repetindo em nossa época a triste cegueira dos habitantes de Nazaré – o considerarmos apenas como o pobre carpinteiro da Galiléia. Para não nos tornarmos culpados de um erro que poderia ser qualificado de “calúnia hagiográfica”, procuremos analisar a verdade a respeito deste varão destinado a uma das mais altas vocações da História.

Deus escolhe sempre o mais belo

Deus Todo-Poderoso, para quem “nada é impossível” (Lc 1, 37) e que tudo governa com sabedoria infinita, possui algo que poderíamos chamar de sua “única limitação”: ao criar, Ele nada pode escolher de menos belo e perfeito, ou que não seja para sua glória. Desde toda a eternidade, ao determinar a Encarnação do Verbo, quis o Pai que – apesar das aparências de pobreza e humildade através das quais Se mostraria, e que contribuiriam para sua maior exaltação – a vinda de seu Filho ao mundo se revestisse da suprema pulcritude conveniente a Deus. Assim, dispôs que Ele fosse concebido por uma Virgem, concebida por sua vez sem pecado original, unindo em Si as alegrias da maternidade à flor da virgindade. Porém, para completar o quadro, tornava-se necessária a presença de alguém que projetasse na terra a própria “sombra do Pai”. Para tal missão Deus destinou José, ao qual poderíamos aplicar as palavras da Escritura, referindo- se a seu antepassado Davi: “O Senhor escolheu para Si um homem segundo o seu coração” (1 Sm 13, 14).

Paróquia de São José – Sevilla, Espanha

Trecho retirado do Artigo: “O varão a quem Deus chamou de pai”, do site www.arautos.org.br