Há na comunidade uma irmã que tem o talento de me desagradar em todas as coisas; os seus modos, as suas palavras, o seu caráter me eram muito desagradáveis.

No entanto é uma santa religiosa que deve ser muito agradável ao bom Deus. Assim, não querendo ceder à antipatia natural que sentia, disse a mim própria que a caridade não devia ser composta por sentimentos, mas por obras.

Decidi então fazer por esta irmã aquilo que faria pela pessoa que mais amasse. Cada vez que a encontrava rezava ao Senhor por ela, oferecendo a Ele todas as suas virtudes e méritos.

Sentia que isso agradava a Jesus, pois não existe artista que não goste de receber louvores pelas suas obras e Jesus, o artista das almas, fica feliz quando não nos detemos no exterior mas, penetrando até ao santuário íntimo que Ele escolheu para morar, admiramos a sua beleza.

Não me contentava em rezar muito pela irmã que me suscitava tantos combates, obrigava-me a fazer-lhe todos os favores possíveis e, quando tinha a tentação de lhe responder de modo desagradável, contentava-me em lhe fazer o meu sorriso mais amável e fazia por desviar a conversa.

E também muitas vezes, tendo algumas relações de trabalho com essa irmã, quando os embates eram demasiado violentos, fugia como um desertor. Como ela ignorava totalmente o que eu sentia por ela, nunca desconfiou dos motivos da minha conduta e continua persuadida de que o seu caráter me agradava.

Um dia, no recreio, disse-me mais ou menos estas palavras com um ar muito contente: “Pode dizer-me, irmã Teresa do Menino Jesus, o que a atrai tanto em mim, pois de cada vez que olha para mim a vejo sorrir?” Ah, o que me atraía era Jesus, escondido no fundo da sua alma. Jesus torna doces as coisas mais amargas.

 Santa Teresinha, Carmelita, Doutora da Igreja (1873-1897)

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