Quando se fala em reis e rainhas, logo se pensa em coroas… Quando terá surgido a primeira?
Será que os reis mais antigos da História já as usavam? Disso não se guarda a memória,
pois esse registro perdeu-se na noite dos tempos, se é que chegou a existir. A pena de Fustel de Coulanges, historiador francês do século XIX, descreve esses tempos antigos com maestria, ao dizer que as grandes famílias geraram tribos e, por sua vez, essas tribos reunidas constituíram os primitivos reinos. Em algum momento, os líderes desses clãs perceberam que seu venerável patriarca, descendente direto dos fundadores daquela pequena nação, já ultrapassava, por sua autoridade e importância, a mera condição de chefe tribal ou líder familiar. Se terá sido ungido por algum sumo sacerdote, eleito entre os anciãos ou aclamado por todo o povo, não sabemos. Mas o certo é que a partir do momento em que surgiu um rei, foi necessário criar alguma insígnia para o distinguir, pois mesmo os mais primitivos grupos humanos reconheciam o valor inestimável dos símbolos. Talvez desse modo tenha nascido a coroa real. É muito provável que ela não possuísse, ainda, o formato que nos é familiar, mas, indiscutivelmente, já tinha como escopo distinguir o soberano, ornar sua fronte e realçar sua dignidade. Com efeito, o soberano estava para a nação como a cabeça para o corpo. Nele residia a alta e nobre função de erigir tudo quanto estava sob seu domínio. Por isso, a coroa, símbolo da autoridade, era própria a ornar a fronte de seu detentor, por ser a parte mais nobre do corpo, a que governa todos os seus membros e órgãos. E assim como alguém chamado a desempenhar o papel de cabeça, em qualquer grupo humano, deve estar revestido das mais altas virtudes, assim também na coroa devem estar incrustadas as mais preciosas pedras, símbolo das virtudes do soberano. A evolução do formato dos diademas reais, ao longo da História, certamente reflete de algum modo a mentalidade dominante na época. Por exemplo, na Antiguidade, à autoridade estava ligado o conceito de força. Para citar apenas um exemplo, no Império Romano, onde o Direito estava tão desenvolvido, pouco peso tinha a ciência das leis, quando se tratava de escolher e aclamar um novo César… O mais forte, o general vitorioso era com mais frequência o escolhido. E de tal modo se idolatrava a força que os romanos, tão sensatos noutras matérias, chegavam ao absurdo de cultuar o imperador como deus!!! Culto esse instituído por lei, que Constantino, o Grande, aboliu, não sem certa dificuldade… Da coroa de louros dos
Césares romanos estava ainda ausente a justiça, que só brilharia com todo o seu fulgor na Igreja Católica. Constantino, o primeiro imperador cristão, introduziu uma mudança substancial no conceito de autoridade e… nas coroas dos soberanos. Ao receber de sua piedosa mãe, a Imperatriz Santa Helena, as relíquias da Paixão, mandou incrustar em sua coroa um dos pregos usados na crucifixão de Nosso Senhor. Dessa forma, não só reconhecia que d’Ele lhe vinha a autoridade, mas também que o exercício do poder significa uma verdadeira crucifixão. Pois a autoridade não existe para vantagem e glória pessoal do governante, mas para servir o bem comum. E por esse aspecto pode ser comparada a um sacerdócio. Cônscios dessa realidade, os soberanos católicos passaram a encimar suas coroas por uma cruz. Em muitas delas, os aros não se unem no topo, formando uma bela ogiva, mas se vergam, subjugados pelo peso da cruz. Bela simbologia, para lembrar aos detentores de autoridade — em todas as capilaridades da sociedade, chegando até o lar, onde o pai de família exerce seu “reinado” — que esta é uma cruz. Pois o verdadeiro dirigente deve ser o primeiro em seu campo de ação, e exemplo de virtude para seus subordinados. E, quantas vezes, quando o subalterno deixa cair ao longo do caminho a cruz, abatido pelo desânimo ou inconformado pela falta de resignação, seu superior é que tem de carregá-la… Por isso, aos governantes são atribuídas honras ou títulos, de forma a reconhecer o sacrifício inerente ao exercício do poder. É o caso, por exemplo, do Romano Pontífice, a suprema autoridade espiritual na face da terra. Entre seus títulos, sem dúvida, o mais belo é o de “Servo dos servos de Deus”.
Texto: José Antonio Dominguez
Fotos: Gustavo Kralj
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