Considerações sobre como dar verdadeira importância ao tempo que dispomos e que devemos prestar contas, de Santo Afonso Maria de Ligório.
Qual é o preço do tempo
O tempo vale tanto como o Céu, porque o Céu é a recompensa que Deus assinalou ao bom uso do tempo. Um só momento bem empregado pelo bom ladrão alcançou-lhe, apesar dos crimes da sua vida anterior, a posse do Céu; e ainda quando, com a santidade da nossa vida, sejamos dignos do Céu, um novo instante bem empregado pode conseguir-nos um novo grau de glória e felicidade por toda a eternidade, isto é, como que um novo Céu no mesmo Céu.
O tempo vale tanto como o Sangue de Jesus Cristo: porque esse Sangue é o preço pelo qual nos foram resgatados todos os momentos da nossa existência; é como a moeda que representa o valor do tempo. Se, pois, esse Sangue se chama [infinitamente] precioso, o tempo deve ser-nos precioso na mesma proporção, isto é, além de toda a expressão: porque, quem poderia dizer o valor desse Sangue, do qual uma só gota teria bastado para resgatar milhares de mundos?
O tempo vale tanto como Deus, porque cada instante bem empregado pode alcançar-nos a posse de Deus na Eternidade.
Finalmente o tempo é de tão elevado preço, que Deus não o dá senão gota a gota, se assim posso dizer, sem conceder jamais dois instantes conjuntamente. Só podemos gozar de um curto momento, que passa corno o relâmpago; e se deixamos de o aproveitar, perdemo-lo para sempre, irreparavelmente1; pois, nem o tempo passado volta, nem outro tempo pode repará-lo: 1°) Porque esse outro tempo é já devido a Deus e o que é devido não poderia pagar outras dívidas; 2°) Porque o tempo, podendo ser-nos tirado a cada momento [pela morte], é a coisa do mundo mais incerta, e uma coisa incerta não pode ser destinada para pagar uma dívida certa: donde se segue que devemos fazer, com relação ao tempo, o que fazem os que, tendo poucos rendimentos, não gastam nem uma parte deles em despesas inúteis e tiram do que possuem o melhor proveito possível. É assim que temos avaliado o tempo?
Modo de fazer bom uso do tempo
1°) É preciso fazer a cada momento o que Deus exige de nós com relação a esse momento. Como o tempo pertence a Deus e não a nós, não temos direito de dispor dele para outro uso senão o que Ele quer, de ceder a menor parte dele ao gosto ou desgosto do momento e de consultar o capricho sobre o uso que dele havemos de fazer.
2°) É preciso fazer tudo com o fim de agradar a Deus. Deus só recompensa o que se faz por Ele. Se obramos por amor de nós, da criatura, perdemos o nosso tempo e trabalho. Em vão faziam os fariseus boas obras; Jesus Cristo declarou que eles nenhuma recompensa receberiam, porque as faziam para se exaltarem a si e não para agradar a Deus! Oh! quantos momentos se perdem assim!
3°) É preciso fazer todas as coisas o melhor possível. Em todas as vossas obras conservai a vossa preeminência2, diz o Espírito Santo. Fazer as coisas com negligência e imperfeição, quando nos propomos fazê-las por Deus, é faltar ao respeito a Deus3: porque quanto mais eminente é o personagem por quem trabalhamos, tanto mais perfeito deve ser o que fazemos por Ele. “Por quem fazeis esta obra?” perguntou um dia Santo Inácio a um dos seus religiosos, negligente na sua reza. “Faço-a por Deus”, respondeu este. “Tanto pior, replicou Santo Inácio: se a fizésseis por mim, eu vos teria desculpado de a fazerdes mal; mas visto que é por Deus que a fazeis, não tendes desculpa de empregar nela tão pouco cuidado e desvelo”.
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